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Liberdade?

  • Foto do escritor: Renato Grinbaum
    Renato Grinbaum
  • 5 de set. de 2015
  • 3 min de leitura

A expectativa prejudica enormemente a apreciação e a apreensão de um texto. Foi com esta expectativa que mergulhei no texto de Franzen. Eu tinha duas grandes expectativas, nascidas de revisões e críticas que li. A primeira delas vinha das grandes frases e expressões sobre o livro. Algo como " Um retrato fiel da sociedade americana pós-moderna". Ou "a melhor descrição da família de classe média da América." Estes chavões geraram em mim uma expectativa negativa. Em primeiro lugar, falar "da América" nos dá a impressão de um livro sem universalidade, da retratação de questões locais, sem maior apelo, o que me gera, no máximo, uma curiosidade. Por outro lado, estas frases elogiosas de efeito soam a uma apelação do crítico, como se tivesse lido o livro superficialmente, buscando somente o enredo e procurando encontrar o melhor efeito para ser citado ou para causar impacto entre os leitores do seu periódico.

Outra expectativa é o excessivo hype, louvor ao autor. Os elogios parecem virais. Repetitivos. Todos os críticos ressaltam o mesmo ponto, como se tivessem sido convidados para a mesma viagem para a divulgação do livro, num hotel de cinco estrelas. Muitos dos autores celebrados desta forma caem rapidamente no esquecimento ou no gosto de um público que não diferencia os talentos literários contidos em "cinquenta tons de cinza" daqueles que estão em livros que jamais leram, como "em busca do tempo perdido". Nem sempre é assim. Alguns daqueles que são aprovados pelos críticos e reconhecidos pelo público conquistaram este difícil feito pelo talento. Knausgard, por exemplo. "Liberdade" não é nada disto. É um livro competente.

O texto é realmente de boa qualidade. O livro é ambientado num subúrbio de classe média americana que há muitos anos se tornou um celeiro de obras de arte. Não é necessário restringir a literatura ao sofrimento dos pobres ou aos efeitos dos heróis nada comuns. A vida do Homem comum é rica. Os livros sobre a classe média são nosso incômodo espelho.

Não se trata de um livro tecnicamente inovador ou distintivo. Ao contrário, ele é simples e direto, nada contra esta objetividade, mas também não justifica sua reputação, sob este aspecto. a narração em terceira pessoa é direta, linear, sem digressöes, manipulação de tempo ou foco, variação de estilo ou de formas de linguagem. Na verdade, é uma autobiografia narrada em terceira pessoa, o que é pouco usual, mas sem grande inventividade.

Franzen conta uma boa história. Neste aspecto, parece um escritor que passou por muito treino e cursos técnicos, mas que não coloca sua forma particular de expressão na escrita. Não se iguala à pobreza de expressão de um livro de aventuras best-seller. O que talvez tenha de mais interessante éo o uso do futuro imperfeito misturado ao presente para dar a impressão de uma expectativa consumada.

O enredo não é completamente linear. No início ele entremeia passado e presente e seu uso do tempo futuro antecipando os fatos e ações é interessante. Mesmo quando muda de narrador, a linguagem continua a mesma. A autobrografia de Patty, contada cronologicamente, é um dos fragmentos que perde o interesse com este monotom da linguagem. Em nenhum momento há uma inovação que justifique tanto louvor, nem mesmo na qualidade da sua prosa.

O forte de "Liberdade" é a trama psicológica, a construção do enredo e dos conflitos, as escolhas que fazem os personagens serem o que são, com densidade. Ambíguos, mesquinhos, dotados de uma bondade aparente, possuidores de uma destrutividade em seu interior, o grande problema é que tudo parece se passar num grande deja vù. Franzen escreve o que se espera dele, dizer mais uma vez que a classe média americana é perversa sob o véu das aparências.

Na verdade, sua escrita e seu enredo não se distinguem daqueles de muitos outros escritores, também de qualidade, como Jeffrey Eugenides e , entre outros. John Updike, com maestria. Já seu enredo nos remete também ao cinema, filmes como "Felicidade" e "Beleza americana". Todos abordando as relações psicológicas do americano mediano do subúrbio. Suas neuroses e perversões. Sua falsa tolerância, politicamente correta, que esconde uma intolerância beligerante. O sonho americano da vida em harmonia com suas vitórias. Tema abordado com maestria por Philip Roth em "Pastoral americana".

Como já afirmado, o forte de "Liberdade", assim como seus similares, está na construção dos personagens através de suas escolhas morais. Alguns deles são exagerados, um pouco comuns dentro do imaginário da literatura americana. Jovens sem rumo, fruto de famílias desestruturadas pelo álcool e pelos inúmeros divórcios. O distanciamento afetivo entre as pessoas e sua falsa proximidade moral. Neste aspecto o texto de Franzen é bastante forte e não pode de ser descartado.

"Liberdade" é um romance psicológico realista feito com habilidade, mas que não traz nada muito distintivo,mnem diferente de outras obras similares. Talvez não considere "Liberdade" uma obra prima, como foi celebrado, mas é certamente um bom livro.

 
 
 

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