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Um grande livro, um grande tapa

  • Foto do escritor: Renato Grinbaum
    Renato Grinbaum
  • 5 de set. de 2015
  • 2 min de leitura

Toda criação começa por uma sensação de injustiça.


Se houvesse justiça em arte, a obra deveria ser julgada por seus méritos. Mas é avaliada pela sua inovação, pela pertença aos padrões da época - paradoxalmente conservador -, pelo grau de relação do autor com seus juí­zes e pela imagem do autor na comunidade. Stoner foi esquecido por muitos anos por muitos anos por uma ou mais destas razões. E descoberto para a felicidade de alguns apreciadores deheróis esquecidos quase quarenta anos após a sua publicação, quase vinte anos apos a morte de John Williams. Foi assim com o cantor Nick Drake e com o compositor dinamarquês Rued Langgaard. Uma falsa posteridade, não revelada ao seu postulante antes de sua própria morte. Talvez por isto mesmo atraia tanto, além de suas próprias qualidades. Um senso de descoberta, de erudição e de benevolência se grudam ao leitor que gosta de Stoner.

O livro tem que ser julgado por seus méritos. Ele conta a história de um homem comum e sua rotina miúda, seu temperamento introspectivo e seco que destrói lentamente suas expectativas. Ele constrói sua própria frustração.

Stoner tem uma linguagem quase seca, estrutura direta e linear, fora da época que foi escrito. Personagens fortes e claros, sem experimentalismos. Williams conta uma história maravilhosa, o mais completo espelho de todos nós, talvez por isto mesmo angustiante e doloroso. Suas poucas digressões são cirurgicamente pontuais, perfeitas, expõem nossa normalidade com uma lucidez tocante. Aborda nosso conceito de morte, de motivação e sentido da vida, posteridade e morte talvez como nenhum outro. Simples e tocante ele mostra o sentido do nosso sentido sem nenhuma piedade. Nem otimista nem pessimista. Como um clássico deve ser.

Em alguns aspectos, ele tem um personagem mais que moderno, que talvez não fosse muito compreendido nos transformadores anos 60. Um primeiro paralelo que poderia ser firmado seria com Bartleby, um homem sem ação,totalmente entregue ao destino. Stoner não tem força nem temperamento para enfrentar os fortes desafios das decepções profissionais, e, pior, da frustração precoce da própria esposa. Ele é envolvido em jogos que não tem a menor força para enfrentar, sem referências, sem amigos que o guiem, sem um lugar o qual pertença. Stoner é o homem atual, que tem contatos, e não ví­nculos.

Stoner também pode ser discutido à luz de Camus. Em O Estrangeiro, o homem não tem mais o ideal de Deus e não se importa. Está desencantado. Este homem desencantado na civilização ocidental está em busca de reconhecimento, de uma marca que dá sentido para sua vida, uma vez que Deus perdeu sua força mesmo entre aqueles que mais acreditam nele. A marca tem que ser registrada pelo indiví­duo em sua igreja, em seu ambiente profissional, em sua arte, como se a sua obra lhe desse a permanência do paraí­so perdido. Stoner é o homem pós-tribos. Desesperado e sem ví­nculos, ele só precisa de seu próprio reconhecimento. Na fabulosa cena final do livro, ele encontra felicidade no seu livro, que assim como o restante da sua vida era um completo fracasso. Para Stoner o orgulho de sua obra esquecida era o suficiente para dar justificativa à sua vida. É impossí­vel não sofrer com Stoner.



 
 
 

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