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Memórias da surpresa

  • Foto do escritor: Renato Grinbaum
    Renato Grinbaum
  • 23 de set. de 2015
  • 2 min de leitura

Frustra ilusão, achar que um dia terei lido pelo menos um livro de cada autor importante. A cada dia, surge alguma informação sobre alguém que deveríamos ter lido, mas nunca tínhamos ouvido falar. São tantos, que tenho que me conformar com aquilo que tenho fôlego, sem pretensões.

Saindo da inexistência com surpresa, subitamente tenho em mãos "Memórias de um empregado", de Federigo Tozzi, italiano da Toscana suficientemente relevante para ter sido uma das maiores influências de escritores como Alberto Moravia. Importante no cenário italiano, desconhecido por aqui. Sua produção foi pequena, o que parcialmente explica seu quase esquecimento fora da Itália. Morreu precocemente, vítima da gripe espanhola.

Seu livro traz uma tradição de realismo, a cara da Itália, especialmente ao mostrar a vida da coasse operária. Paremos por aí: não é mais um livro anarquista ou de conteúdo forçadamente político. Em primeiro lugar, há a forma. A sequência narrativa quebra sua linearidade ao entrar no fluxo de pensamento do personagem principal, trazendo à tona toda a subjetividade que transformou a realidade numa interação entre o fato e a mente. O romance progride para uma estrutura fragmentária, os capítulos finais às vezes com quatro linhas. Parágrafos aparentemente desconexos, mas facilmente ligáveis, ao se perceber que ele não está seguindo os fatos, mas o raciocínio. Apesar da subjetividade, Tozzi não perde o realismo, não há fantasia, devaneio ou canção, muito menos mágica. A linguagem é direta, mesmo que sua lógica seja interior.

O enredo aparentemente circula ao redor da submissão do filho na família patriarcal, de ambiente dos trabalhadores ferroviários. A tensão real é moral, está no comportamento, no princípio e nas escolhas do jovem rapaz. A construção psicológica do personagem, mesmo num espaço tão curto é excepcional. Tozzi cria o conflito entre a vida no mundo novo e no antigo. Especialmente no mundo do emprego, da máquina, das relações superficiais e irônicas, onde um olha para o outro em busca da conformação a uma estrutura sem sentido. Não há emocionalismo.

Mesmo com a modernidade, que Tozzi participou em seu início, "Memórias de um empregado" é um livro fabuloso que nos abre o apetite para outras traduções dos seus livros.

 
 
 

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